Presidente já errou na previsão das receitas para a temporada e tem tudo para errar também nos custos. No longo prazo, esta foi a fórmula para endivid

Opinião: Sérgio Sette Câmara estoura as contas do Atlético-MG em 2020 e troca discurso de austeridade pelo populismo

Não sabemos como será o desempenho esportivo do Atlético-MG com Jorge Sampaoli. A julgar pelo o que se viu no ano passado com o Santos e pelo currículo do técnico argentino, a chance de que seja muito bom existe. Sabemos, no entanto, que o presidente atleticano Sérgio Sette Câmara acaba de cruzar a linha da responsabilidade.

Para entender as consequências deste início de temporada, precisamos voltar ao orçamento para 2020. Este documento é produzido pelo departamento financeiro do clube, no qual há previsões de receitas e custos para o ano inteiro. Supostamente, a diretoria atleticana deveria se basear nos números previstos nele para tomar decisões.

Em primeiro lugar, precisamos olhar para as receitas. O Atlético-MG tinha uma projeção de R$ 309 milhões a arrecadar durante a temporada, com alguns itens complicados. Na venda de jogadores, precisaria fazer pelo menos R$ 100 milhões. Na televisão, em que estão pagamentos por performance, necessitava de um ótimo futebol dentro de campo.

Das previsões esportivas, duas já furaram. A eliminação na Sul-Americana impede que o clube chegue às oitavas de final, fase necessária para cumprir o orçamento. A eliminação ainda mais humilhante na Copa do Brasil impede que chegue às quartas de final. A partir de agora, mesmo que seja campeão do Campeonato Brasileiro, não cumprirá as receitas previstas. Não entrará dinheiro suficiente.


Em segundo lugar, temos de entender os custos. Sérgio Sette Câmara sustentou em seus dois anos de mandato que faria uma administração austera. E o orçamento até dava a entender que ele teria uma prática condizente com o discurso. O orçamento para 2020 previa custos no mesmo patamar dos realizados em 2019. Sem reduções, nem aumentos.

Bastaram dois meses e duas eliminações para que o presidente chutasse a austeridade para escanteio. A demissão do técnico venezuelano Rafael Dudamel gerou uma dívida superior a R$ 2 milhões – que o estrangeiro, com razão, como mostra o UOL, faz questão de receber integralmente. Além disso, a comissão técnica de Sampaoli chega com um custo mensal para lá de alto, acima do R$ 1,2 milhão por mês.

Isso nos leva ao terceiro e último ponto no confronto entre as projeções do orçamento e a realidade. Mesmo que cumprisse tudo o que estava planejado, o Atlético-MG precisaria tomar nada menos do que R$ 80 milhões emprestados para manter as contas em dia. Custos operacionais, juros sobre dívidas e o pagamento das próprias dívidas têm estrangulado o clube faz tempo. A situação já era muito difícil.

Como Sérgio Sette Câmara errou nas receitas e tem tudo para errar também nos custos, agora aumenta a necessidade de vendas de jogadores – muito acima dos R$ 100 milhões orçados – ou da tomada de novos empréstimos. E tome dívida para limpar a barra do presidente.

Um detalhe: do R$ 1,2 milhão que corresponde ao custo mensal da comissão técnica de Sampaoli, o Atlético-MG deverá arcar com cerca de R$ 500 mil, enquanto "parceiros" cuidarão dos R$ 700 mil restantes.

O "parceiro" deverá ser Rubens Menin, atleticano que preside a construtora MRV. Mas o Atlético-MG não explicou nada sobre a tal parceria. O empresário vai doar o dinheiro? Fará um patrocínio, tendo como contrapartida a imagem de Sampaoli para propagandas? Ou assinará um contrato de mútuo, ou seja, um empréstimo? A resposta para a pergunta vai dimensionar o tamanho do problema.

Sim, problema. Mesmo que mecenas como Menin resolvam rasgar dinheiro próprio em nome do amor pelo clube – como já fizeram outros empresários atleticanos no passado –, a conta atleticana dificilmente fechará. Ainda mais se lembrarmos que Sampaoli chega com a demanda pela contratação de cinco jogadores para reforçar o elenco.

O orçamento previa R$ 20 milhões em investimentos para a contratação de jogadores. Um valor que tinha sido ultrapassado com apenas duas compras – de Allan por R$ 13,6 milhões e de Guilherme Arana por R$ 13,8 milhões (considerando apenas o valor inicial, pelo empréstimo de dois anos, fora o que precisará ser pago conforme metas forem cumpridas). Ainda há MaíltonDylan BorreroSavarino... O Atlético-MG já tinha gastado muito mais do que calculou ser possível para a temporada. E agora vai atrás de mais cinco para satisfazer Sampaoli.

Sérgio Sette Câmara prometeu austeridade, mas não resistiu à política. Em seu último ano de administração, com eleição pela frente, o presidente atleticano cruzou a linha da responsabilidade e partiu para o populismo com imprensa e torcida – tanto que o anúncio da contratação de Sampaoli foi feito em sua conta pessoal no Twitter. Pode ser que o técnico dê jeito no time e arranque uma boa colocação no Brasileiro. Pode ser que não. No longo prazo, o Atlético-MG já perdeu.